LEITURA
BÍBLICA
Jó 11.1-9 “Então, respondeu Zofar, o naamatita, e disse: 2 - Porventura, não se dará resposta à multidão de palavras? E o homem falador será justificado? 3 - Às tuas mentiras se hão de calar os homens? E zombarás tu sem que ninguém te envergonhe? 4 - Pois tu disseste: A minha doutrina é pura; limpo sou aos teus olhos. 5 - Mas, na verdade, prouvera Deus que ele falasse e abrisse os seus lábios contra ti, 6 - e te fizesse saber os segredos da sabedoria, que é multíplice em eficácia; pelo que sabe que Deus exige de ti menos do que merece a tua iniquidade. 7 - Porventura, alcançarás os caminhos de Deus ou chegarás à perfeição do Todo-Poderoso? 8 - Como as alturas dos céus é a sua sabedoria; que poderás tu fazer? Mais profunda é ela do que o inferno; que poderás tu saber? 9 - Mais comprida é a sua medida do que a terra; e mais larga do que o mar. 10 - Se ele destruir, e encerrar, ou juntar, quem o impedirá?”
Jó 20.1-10 “Então, respondeu Zofar, o naamatita, e disse: 2 - Visto que os meus pensamentos me fazem responder, eu me apresso. 3 - Eu ouvi a repreensão, que me envergonha, mas o espírito do meu entendimento responderá por mim. 4 - Porventura, não sabes tu que desde a antiguidade, desde que o homem foi posto sobre a terra, 5 - o júbilo dos ímpios é breve, e a alegria dos hipócritas, apenas de um momento? 6 - Ainda que a sua altura suba até ao céu, e a sua cabeça chegue até às nuvens, 7 - como o seu próprio esterco perecerá para sempre; e os que o viam dirão: Onde está? 8 - Como um sonho, voa, e não será achado, e será afugentado como uma visão da noite. 9 - O olho que o viu jamais o verá, nem olhará mais para ele o seu lugar. 10 - Os seus filhos procurarão agradar aos pobres, e as suas mãos restaurarão a sua fazenda.”
INTRODUÇÃO
Nesta lição veremos o discurso de Zofar, o
último amigo de Jó a falar na série de debates (Jó 11; 20). Ele insistirá na
tese de que o justo não passa por tribulação, à semelhança do que pensavam seus
amigos Elifaz e Bildade. Todavia, Zofar é mais duro e impiedoso na acusação
contra Jó. Ao contrário de seus amigos, ele faz dois discursos suficientes para
derramar seu ressentimento contra o patriarca. Ele o acusa de se levantar
contra sabedoria divina e aconselha Jó a voltar-se para Deus.
I. DEUS SE MOSTRA SÁBIO QUANDO AFLIGE O PECADOR
1. Deus grande e sábio. Zofar defende que o sofrimento de Jó fazia parte de um sábio julgamento divino, pois, para ele, Deus demonstra grande sabedoria em reprimir os maus. Por outro lado, os bons jamais passam por tribulação. Para Zofar, se alguém deve algo tem de pagar. Com dureza, o terceiro amigo de Jó não demonstra a mínima compaixão pelo sofrimento do patriarca de Uz ao acusá-lo de que se comporta como um animal irracional, um jumento que não tem entendimento (11.12) ao não perceber a sabedoria divina na condução das coisas. Para Zofar, Jó valeu-se na sua defesa de palavras exageradas (11.2), desrespeitosas (11.3), cheias de justiça própria (11.4) e ignorantes sobre as coisas de Deus (11.5,6).
2. Deus não é indiferente à ação do ímpio. O terceiro amigo de Jó acreditava que ele havia se autodeclarado “puro” e “sem culpa” (Jó 11.4; cf. 9.21; 10.7). Cria também que Deus não é indiferente à ação do ímpio como Jó parecia ter sugerido. Assim, para Zofar, se Deus debatesse com Jó, como era desejo deste, então não haveria dúvidas de que Ele ficaria contra o patriarca e não ao seu favor. Nesse embate, Deus revelaria a Jó os segredos de sua sabedoria e o homem de Uz veria que Ele estava sendo sábio em tratá-lo como merecia. Logo, Jó seria condenado.
3. Tolos se passando por sábios. Jó reage com ironia à “sabedoria” defendida anteriormente por seus amigos (“vós”, Jó 12.2) e agora por Zofar. Este, juntamente com seus amigos, havia se levantado como legítimo representante do verdadeiro saber. Zofar, pois, pretende representar o próprio Deus em seu discurso (Jó 13). Todavia, Jó está convencido de que isso não passava de charlatanismo: “Vós, porém, sois inventores de mentiras e vós todos, médicos que não valem nada” (Jó 13.4). Ele, portanto, está resoluto em deixar os amigos e ir à procura de Deus: “Mas eu falarei ao Todo-Poderoso; e quero defender-me perante Deus.” (Jó 13.3). O patriarca estava certo de que havia uma sabedoria do alto, que seus amigos desconheciam por completo, e, quando revelada, ficaria ao seu lado (cf. cap.28).
No lugar dos julgamentos dos homens, há
uma sabedoria do alto que sonda os corações dos que são chamados pelo nome do
Senhor, pois este não vê como os homens veem (1º Sm 16.7).
Deus é grande e sábio; os amigos de Jó
tentam se passar como representantes dessa sabedoria.
II. A CONVERSÃO COMO RESPOSTA À AFLIÇÃO
1. Purificação moral. Nos versículos 13-20 do capítulo 11, Zofar conclui seu discurso sobre a situação de Jó. Ele não tem dúvidas de que o patriarca está em pecado e, por isso, a única forma de ele se restabelecer é por meio de uma purificação moral. Zofar, portanto, conclama Jó ao arrependimento e conversão. Ele enumera três passos para que isso aconteça: conduta correta (v. 13); oração (v. 13) e renúncia ao pecado (11.14). Então, segundo Zofar, se Jó cumprisse essas condições, reconhecendo que estava em pecado, Deus o restauraria de sua miséria. Entretanto, a ideia de arrependimento de Zofar é mais de natureza externa do que interna. O que está em vista é uma teologia do moralismo salvífico em vez da graça divina. Nesse aspecto, o arrependimento não passava de um mero ritual. Na teologia de Zofar a simples prática desses ritos trazia consigo o poder de conferir o favor divino. Na verdade, isso era o que se conhece hoje como legalismo religioso.
2. É possível negociar com Deus? Estudiosos destacam que Zofar tenta induzir Jó a negociar com Deus a fim de se ver livre de suas dificuldades. Era exatamente isso que Satanás desejava que Jó fizesse (Jó 1.9). O Diabo acusou Jó de ter uma fé interesseira, com base nas promessas de prosperidade em troca de sua obediência. Se Jó tivesse seguido o conselho de Zofar, teria feito exatamente o que o Inimigo queria.
3. A angústia de Jó. Diante das insistentes acusações dos amigos e do silêncio de Deus, Jó dá sinais de desânimo (cap.12-13). Ele manifesta de vez toda a sua condição humana. O justo sofre!
Se Jó seguisse o conselho de Zofar estaria
assinando um termo de confissão. Assumindo algo que não havia feito. Ele sabia
de sua integridade e, por isso, não se sujeita a esse capricho do amigo. Isso o
lança num dilema angustiante. No capítulo 14, ele demonstra que sua esperança
está desvanecendo, comparando-se a uma flor que é cortada, uma sombra que
desaparece e um empregado que trabalha, mas que logo é dispensado. Qual o
sentido da vida nessas circunstâncias? Haveria esperança? Jó parece estar
desiludido. Até mesmo uma árvore quando tem seu tronco cortado volta a ter
brotos novamente, mas isso não acontecia com o homem. Nesse aspecto, o homem se
assemelhava mais a água que evapora ou que se infiltra na terra. Diante desse
quadro, Jó se pergunta: “Morrendo o homem, porventura, tornará a viver?” (Jó
14.14). Era a pergunta de um homem crente e piedoso, porém, angustiado, que não
tem medo de expressar sua verdadeira condição humana.
Zofar tenta uma espécie de purificação
moral de Jó, conclamando-o ao arrependimento ritualístico.
4. “Exortação à humildade e ao arrependimento (11.13-20). Zofar foi insensível até aqui, a ponto de ser ríspido em seu tratamento com Jó. Mas ele não entregou os pontos em relação ao seu antigo amigo como se fosse um caso perdido. Ainda existe a oportunidade de Jó recuperar-se da sua terrível condição. Visto que ele está certo de que algum pecado cometido por Jó é a raiz da sua condição e que o sofrimento de Jó resulta desse pecado, a resposta é simples. Jó deveria estar aberto e humilhar-se em relação ao seu mau procedimento. Isso exige reparação, inclusive uma preparação apropriada do seu coração (13) para colocá-lo num relacionamento correto com Deus. Estende as tuas mãos para ele subentende súplica em oração para remover a iniquidade da sua vida e do seu lar (13-14). Quando isso for feito, Jó estará apto a levantar o seu rosto sem mácula (15). Sua vida será mais radiante e alegre do que antes. Todas as causas do medo serão removidas, e em seu lugar haverá segurança e esperança em sua vida (17-19). Zofar pede para ele olhar em volta. Muitos acariciarão o teu rosto (19) significa: ‘Muitos procurarão o seu favor’ (NVI)” [CHAPMAN, Milo L.; PURKISER, W. T.; WOLF, Earl C. (et al). Comentário Bíblico Beacon: Jó a Cantares de Salomão. Rio de Janeiro: CPAD, 2014, p. 50].
III. DEUS JULGA E CASTIGA OS PECADORES
1. O castigo dos maus. O capítulo 20 contém o segundo discurso de Zofar. Nele, Zofar lembra a Jó que a aparente prosperidade dos ímpios não passa de ilusão e dura apenas um instante. Na verdade, ele repete o que os seus outros amigos já há muito vinham dizendo (Jó 20.5). Os versículos 12 a 14 desse mesmo capítulo são usados por Zofar para comparar o deleite do ímpio à uma comida envenenada. Ela pode saciar, mas proporcionará uma digestão trágica (Jó 20.14). Dessa forma, tudo o que o ímpio adquiriu de forma desonesta e pecaminosa terá que devolver e restituir (Jó 20.18). Esse ímpio terá como adversário o próprio Deus, que o julgará e punirá (Jó 20.27-29).
2. Jó diante de um paradoxo. O capítulo 21 traz a resposta de Jó ao argumento de Zofar. Para o patriarca a tese de Zofar de que os ímpios são sempre punidos era contraditada pela experiência. Os ímpios poderiam sim ser punidos, mas isso nem sempre parecia acontecer, conforme descrito: “Por que razão vivem os ímpios, envelhecem, e ainda se esforçam em poder?” (Jó 21.7). Jó havia constatado que os ímpios pareciam gozar de longevidade e prosperidade (Jó 21.8). Além de terem vida longa, eles passavam seus dias em total regalia e morriam em total felicidade, como podemos constatar neste versículo: “Passam eles os seus dias em prosperidade e em paz descem à sepultura” (Jó 21.13 - ARA).
3. A verdade vem à tona. A lei da retribuição não se aplica a todas as esferas da existência humana nem explica os caminhos soberanos do Altíssimo, pois Deus também “faz que o seu sol se levante sobre maus e bons e a chuva desça sobre justos e injustos” (Mt 5.45).
Zofar diz que todos os maus são punidos,
mas Jó apresenta um paradoxo: a experiência mostra que muitos deles são bem
sucedidos.
4. Jó um homem de fé. “Após sua grande declaração de fé em 19.25-27, Jó consegue alcançar um grau marcante de serenidade. Mesmo depois das conclusões mordazes do discurso de Zofar, ele não reage com o mesmo tipo de tensão emocional que caracterizam seus discursos anteriores. Neste capítulo ele começa a pensar mais claramente acerca das questões levantadas em vez de gastar suas energias em erupções emocionais que descrevem seu sofrimento e frustração. No ciclo de discursos, a preocupação de Jó era com o fato de sentir que Deus havia se tornado seu inimigo. Em seguida, ele foi esmagado ao perceber que seus amigos o desertaram, a ponto de se colocarem contra ele. Mas agora o discurso de Zofar faz com que Jó assuma uma posição positiva em relação aos argumentos dos seus amigos. Ele contradiz esses argumentos com evidência prática. Ele constata que prosperidade e retidão não andavam invariavelmente juntas. Também fica evidente pela observação da vida que a maldade nem sempre é castigada” [CHAPMAN, Milo L.; PURKISER, W. T.; WOLF Earl C. (et al). Comentário Bíblico Beacon: Jó a Cantares de Salomão. Rio de Janeiro: CPAD, 2014 p.64].
CONCLUSÃO
Vimos como Jó continua sua defesa contra
os argumentos de seus amigos, que insistem em acusá-lo de pecado. Ele está
convencido de que é inocente e que não cometeu nada que justifique tamanho
sofrimento. Os amigos de Jó, por desconhecerem as razões de seu sofrimento, o
acusam de forma impiedosa; e patriarca, por desconhecer a ação de Deus nesse
episódio, chega ao limite do desespero e desesperança. Todavia, como das outras
vezes, mesmo angustiado e não sabendo como Deus permite tudo isso, Jó não diz
palavras blasfematórias contra o seu Criador.
Comentarista: José Gonçalves. A Teologia de Zofar: O justo não passa por tribulação? Lições bíblicas 4º Trimestre de 2020 – CPAD Rio de Janeiro RJ.
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