TEOLOGIA EM FOCO

quarta-feira, 21 de novembro de 2018

O BOM SAMARITANO – QUEM É O MEU PRÓXIMO?



TEXTO ÁUREO:

“Qual destes três te parece ter sido o próximo do homem que caiu nas mãos dos salteadores?” (Lc 10.36).

LEITURA BÍBLICA

Lucas 10.30-36 “Certo homem descia de Jerusalém para Jerico e veio a cair em mãos de salteadores, os quais, depois de tudo lhe roubarem e lhe causarem muitos ferimentos, retiraram-se, deixando-o semimorto. 31 Casualmente, descia um sacerdote por aquele mesmo caminho e; vendo-o, passou de largo. 32 Semelhantemente, um levita descia por aquele lugar e, vendo-o, também passou de largo. 33 Certo samaritano, que seguia o seu caminho, passou-lhe perto e vendo-o, compadeceu-se dele. 34 E, chegando-se, pensou-lhe os ferimentos, aplicando-lhes óleo e vinho; e, colocando-o sobre o seu próprio animal, levou-o para uma hospedaria e tratou dele. 35 No dia seguinte; tirou dois denários e os entregou ao hospedeiro, dizendo: Cuida deste homem, e, se alguma coisa gastares a mais, eu to indenizarei quando voltar. 36 Qual destes três te parece ler sido o próximo do homem que caiu nas mãos dos salteadores?

INTRODUÇÃO. Nesta lição estudaremos acerca da “parábola do Bom Samaritano”, na qual veremos que Jesus conta a história do samaritano para mostrar que o próximo não é um assunto a ser discutido ou definido, mas uma pessoa que a gente encontra e que precisa de ajuda, pouco importando a raça, cultura ou religião.

Na parábola do Bom Samaritano Jesus é questionado sobre a vida eterna por um doutor da Lei, ao desenvolver o diálogo Jesus apresenta o samaritano como exemplo de amor para com seu próximo.

Podemos chamar o texto de Lc 10,25-37 de um episódio-parábola, que tem como figura central “um homem semimorto”. Em torno dele, diversos personagens se posicionam, em quatro cenas, além de uma cena introdutória e outra de conclusão:

I. CARACTERÍSTICAS DA PARÁBOLA

O contexto. Essa parábola é um primor de beleza e advertência para todos nós. Advertência porque o contexto em que a parábola surge tem a ver com a pergunta do doutor da lei: “Quem é o meu próximo?”, pergunta essa que se originou de outra pergunta: “Mestre, que farei para herdar a vida eterna”? Não podemos separar a parábola do seu contexto e a explicação, qualquer que seja, precisa estar em sintonia com esse inquietante tema. Fica muito claro, nela, a crítica de Jesus à religiosidade aparente dos seus dias, representada nesses dois oficiais do judaísmo: o sacerdote e o levita. Jesus não suportava que as pessoas escondessem um coração indiferente e frio com uma aparência religiosa.

Os samaritanos. Isso é importante para melhor compreensão da parábola em questão. Os samaritanos eram um povo misto, de costumes e religião diferente da dos judeus. Sua origem datava de séculos anteriores, quando os Assírios dominaram o Reino do Norte e enviaram os israelitas para outras nações conquistadas e trouxeram exilados de outras partes, forçando uma miscigenação racial, cultural e religiosa. O ponto crucial da discórdia era o templo do monte Gerizim. Essa zanga centenária fazia, desde muito, que a maior parte dos judeus sentisse repugnância em manter relações sociais e religiosas com os samaritanos. O relacionamento deles era deteriorado. Havia uma enorme barreira étnica, religiosa e social entre eles.
Portanto, fica fácil perceber, a partir do que foi dito, que Jesus não foi nem um pouco convencional quando introduziu a figura do samaritano na história contada. A simples menção do samaritano já deve ter provocado um ar de descaso no doutor da lei, mas a descrição dele como o herói era insuportável.

3. O conceito de “próximo”. Para Jesus não basta estar perto, é preciso ser próximo. Tanto o sacerdote como o levita estavam perto do homem caído, mas nenhum deles agiu como “o próximo” dele.

3.1. Ser próximo pode ter muitas implicações. Aqui, nesta parábola, o próximo era:

3.2. Não atraente (o homem caído estava espancado e ensanguentado].

3.3.Sem condições de retribuir (pelo menos naquele momento).

3.4. Implicava numa mudança da agenda.

3.5. Envolvia riscos (e se os ladrões ainda estivessem por ali?).

3.6. Envolveu perda de conforto (ele o colocou na sua cavalgadura).

3.7. Implicou perda financeira (pagou a estada do desconhecido).

Então é simples: toda vez que eu e você encontrarmos alguém que precisa de nós, então encontramos nosso próximo. Para Jesus, o próximo é aquele que precisa de mim.

II. OS PERSONAGENS DA PARÁBOLA

No episódio-parábola de Lc 10,25-37 há vários personagens de vários tipos. Há personagens reais e outros implícitos. Vejamos.

1. Escriba. Homem identificado pela função de especialista na lei mosaica.

2. Jesus. Protagonista de todo o enredo, dirige a reflexão em torno da pergunta feita pelo escriba sobre o que fazer para herdar a vida eterna. Observem que Lucas não cita nenhum nome dos personagens desse episódio-parábola, exceto o de Jesus.

3. Homem assaltado e ferido. “Único personagem que não foi identificado por uma marca social ou geográfica”. Dele se diz somente que viajava de Jerusalém para Jericó. Estava em movimento, depois foi “imobilizado”. Levado para uma hospedaria por um samaritano, onde ficou em “recuperação”.

4. Assaltantes. São diversos, e o “homem” está “no meio deles”, “entre as mãos deles”. O foco não está na ação dos assaltantes, mas no estado deplorável no qual o assaltado foi deixado.

5. Sacerdote. Identificado pelo seu papel no templo. Como o assaltado, passa pela mesma estrada e no mesmo sentido: “Descia de Jerusalém para Jericó” (Lc 10,31). Seus “interesses pessoais”, como também do levita, são mais importantes do que socorrer um ferido, ameaçado de morte.

6. Levita. Personagem “semelhante” ao sacerdote, também identificado pelo seu papel no culto. Assim como o assaltado e o sacerdote, transita pela mesma estrada e no mesmo sentido. Como figuras do culto, o sacerdote e o levita representariam, em Lc 10,30-35, um tipo de piedade que favorece o sacrifício em detrimento da compaixão. Contra isso se levantou o profeta Oséias (Os 6,6, citado em Mt 9,13; 12,7), que enfatiza “quero misericórdia e não sacrifício”.

7. Samaritano. Personagem anônimo; identificado pelo seu país de origem; estrangeiro; impuro, segundo os judeus. “Está em viagem”, no mesmo movimento que os três primeiros personagens; não se sabe se ele ia a Jerusalém ou vinha daquela cidade e este detalhe é importante: tanto o assaltado quanto o sacerdote e o levita viajavam no mesmo sentido, de Jerusalém para Jericó, mas é possível que o samaritano estivesse viajando na direção contrária. Isso pode significar que o samaritano tinha suas responsabilidades pessoais; estava “em viagem” (de Jerusalém a Jericó?) trabalhando. Enquanto isso, o sacerdote e o levita estavam voltando de seu turno de trabalho no templo, e esta circunstância lhes daria maior disponibilidade de tempo.

8. Dono da pensão. Identificado pela sua profissão; não está em viagem por aquela estrada, mas tem uma hospedaria em um determinado ponto da estrada, onde exerce a profissão de acolher as pessoas. “O dinheiro que ele recebe faz dele quase uma extensão impessoal do samaritano”.

III. O DOUTOR DA LEI (Lc 10.25 - ARC)
1. Quem era o Doutor da lei.
No sentido judaico o doutor da lei era um intérprete e professor (mestre) da Lei Mosaica (Mt 22.35; Lc 7.30; 11.45,52; 14.3). Os “mestres da lei” eram os estudiosos judeus da época, profissionais do desenvolvimento, ensino e aplicação da Lei. Sua autoridade era estritamente humana e tradicional. Também eram membros do Sinédrio.

2. O objetivo do doutor da lei.
Lc 10.25 “E eis que certo homem, intérprete da Lei, se levantou com o objetivo de pôr Jesus à prova”.
A intenção não era aprender de Jesus, mas sim, testar Jesus na expectativa de encontrar uma oportunidade para acusar o Senhor Jesus.

3. A situação espiritual dos doutores da lei.
Jesus nos conta como estava a situação espiritual e moral dos doutores da leia ao dizer: Mas Jesus respondeu:
Lc 11.46, 52-54 “Ai de vocês também, intérpretes da Lei! Porque sobrecarregam os outros com fardos superiores às suas forças, mas vocês nem sequer com um dedo tocam nesses fardos. Ai de vocês, intérpretes da Lei! Porque vocês pegaram a chave do conhecimento. No entanto, vocês mesmos não entraram e impediram os que estavam entrando. Quando Jesus saiu dali, os escribas e fariseus começaram a contestá-lo com veemência, fazendo perguntas a respeito de muitos assuntos, com o objetivo de tirar daquilo que ele dizia um motivo para o acusar.
IV. COMPAIXÃO E CARIDADE SÃO INTRÍNSECAS À FÉ SALVADORA

1. Compaixão. A parábola, como um todo, é marcante, mas um momento indispensável em qualquer reflexão sobre ela está no versículo 33, quando o Mestre diz que o samaritano “chegou ao pé dele e, vendo-o, moveu-se de íntima compaixão”. A “compaixão” aqui se refere a um sentimento intenso que causa tanto incômodo a ponto de alterar não apenas a consciência, ou o pensamento, mas também o aspecto físico, pois o texto diz que o samaritano “moveu-se”.

2. Cuidado. O versículo 34 diz que o samaritano “aproximando-se, atou-lhe as feridas, aplicando-lhes azeite e vinho; e, pondo-o sobre a sua cavalgadura, levou-o para uma estalagem e cuidou dele”. Essa ação toca no aspecto da prática do amor, isto é, o cuidado, contida no mandamento, pois este ordena: “Amarás ao Senhor, teu Deus [.] e ao teu próximo como a ti mesmo” (v.27 cf. Lv 19.18). O amor de que trata o mandamento, não é retórico e muito menos platônico, isto é, existindo apenas no mundo das ideias. Deus nos mostra e exemplifica o amor verdadeiro no texto de João 3.16 quando diz que “amou o mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna”. A expressão grega para dizer que Deus amou, neste texto, foi agapao, que se refere ao amor prático, um amor que se comove, um amor que se enche de íntima compaixão. Ensina-nos que não basta dizermos que amamos, e nem mesmo apenas amarmos, há que se avançar para o segundo estágio que é a prática do cuidado (1Jo 3.16-18). Não há demonstração de cuidado sem prática, assim como não há amor sem compaixão.

3. Caridade. O samaritano da parábola não apenas aproxima-se do homem que está ferido à beira do caminho e nem somente se compadece dele, mas decide curá-lo, dar-lhe atendimento de emergência e conduzi-lo a uma estalagem (v.34). Já na estalagem, o samaritano recomenda ao hospedeiro que cuide do homem, pois ele prosseguiria sua viagem e, quando voltasse, pagaria qualquer despesa que tivesse sido gerada (v.35). Tais atitudes são uma clara demonstração de amor, ou seja, o amor do samaritano ao próximo foi expresso em atitudes e ações, ao ponto de se comprometer até mesmo com os gastos que seriam gerados com a hospedagem do homem ferido. Para Cristo, só existe realmente caridade se houver demonstração de amor, pois no texto de João 3.16 não diz apenas que Deus “amou”, mas também que Ele “deu” o seu Filho. A evidência de que Deus ama é demonstrada pela sua compaixão pelo mundo perdido. Deus se compadece e mostra isso na prática (Rm 9.16).

V. O NOSSO PRÓXIMO É QUALQUER PESSOA NECESSITADA

1. O “próximo”. Na Parábola, quem se fez “próximo” do homem ferido foi uma pessoa que o doutor da Lei teria como completamente indigna de receber sua atenção e cuidados, visto que judeus e samaritanos nutriam recíproco sentimento de desprezo e quase ódio. Não havia para aquele doutor exemplo mais doloroso para Cristo utilizar-se. Isso fica demonstrado quando, ao final da narrativa, Jesus pergunta ao doutor da Lei qual dos três havia sido o “próximo” do homem que foi espancado pelos salteadores (v.36) e este se limita a responder: “O que usou de misericórdia para com ele” (v.37). Ou seja, ele sequer diz que foi o “samaritano”. Mesmo assim, a palavra de Jesus, visando responder a pergunta inicial (v.25), foi que o doutor da Lei fizesse o mesmo. Da mesma forma devemos colocar em prática o amor que afirmamos ter a Deus sobre todas as coisas, e ao nosso próximo, pois só assim fazendo estaremos aptos à vida eterna. Infelizmente, nos tempos de Jesus a hipocrisia humana, que faz com que homens conhecedores não sejam praticantes do próprio conhecimento, já estava bem presente na sociedade judaica. Por isso, Jesus teve diversos embates com os doutores da Lei (Mt 23.1-36).

2. Ajudar ao próximo não salva, mas é algo que deve ser feito por quem é salvo. Nesta parábola, Jesus não quer afirmar que o samaritano pudesse alcançar a salvação por causa de sua beneficência e de sua atitude amorosa. Jesus apenas está respondendo à pergunta formulada pelo professor da Lei. É importante salientarmos que fazer obras de caridade não leva ninguém à salvação (Ef 2.8,9). Contudo, os verdadeiros filhos de Deus são “feitos” para as boas obras, isto é, as realizam naturalmente (Ef 2.10; Tg 2.14,17). Assim, Cristo mostra ao mestre da Lei que uma pessoa sincera soluciona facilmente essa questão que, aos olhos daquele homem, parecia tão complexa.

3. A medida do amor para com o necessitado. A medida do amor para com o próximo não deve ser estabelecida com base nas diferenças de nacionalidade, de confissão religiosa ou do grupo social, mas unicamente com base na necessidade do outro. O próximo que se encontra em uma situação de emergência e precisa que algo seja realizado por ele naquele momento, não pode esperar qualquer análise ou palavra “motivacional” (Tg 2.14-16). Por isso, estamos falando em ações concretas, ajudas materiais, assim como na parábola contada por Jesus.

4. Sendo o próximo. O doutor da Lei havia perguntado quem era o próximo dele (v.29). Na resposta de Jesus, a pergunta é inversa, ou seja, de quem eu posso, ou devo, ser o próximo? (v.36). A questão colocada pelo doutor da Lei não continha nenhum interesse ou compromisso em ajudar de verdade. Já a indagação de Jesus forçava-o a pensar acerca dessa obrigação. De acordo com o ensinamento de Jesus, o que fica claro é que o “próximo” trata-se de qualquer pessoa que se aproxima de outras com amor verdadeiro e generoso sem levar em conta as diferenças religiosas, culturais e sociais. Jesus retoma a pergunta inicial e conclui dando uma resposta inesperada, pois o caminho proposto por Ele é pautado no amor, com demonstrações práticas, para com todos os homens (Lc 10.37). O coração cheio de amor fala e age de acordo com a consideração do Mestre, perguntando sempre de quem eu posso ser o próximo, ou seja, a quem devo socorrer.

VI. CONCLUSÕES DA PARÁBOLA

1. Omissão é pecado. Isso também está claro aqui. O pecado deles não foi algo sem importância. Nas Escrituras está dito: “Não te furtes a fazer o bem a quem de direito, estando na tua mão o poder de fazê-lo” (Pv 3.27). Tiago, na mesma sintonia, afirma: “Aquele que sabe que deve fazer o bem e não o faz nisso está pecando” (Tg 4.17). Temos ainda o ensino claro de que a fé sem obras nada vale, é sem vida e estéril (Tg 2.14-26). Hernandes D. Lopes diz: “Indiferença é a apostasia do amor, o divórcio da misericórdia e a morte da sensibilidade, pois quem ama tem pressa em socorrer”. Não é possível nos omitir do que chegou até nós como possibilidade de demonstrar nossa fé e o amor de Cristo.

2. O herói foi o samaritano. O herói da parábola, o excluído, não é o que sofre, é o que cuida. Não podemos ignorar isso. Quem age com grandeza aqui e é erguido por Jesus para ser imitado é aquele que era desconsiderado, que os religiosos achavam que nada teria para contribuir. Os ouvintes da história decerto esperariam que o sacerdote e o levita fossem seguidos por um israelita leigo, seria a sequência lógica. O efeito de introduzir na história um samaritano foi devastador. Tendo em vista o ressentimento tradicional entre os judeus e samaritanos, um samaritano era a última pessoa de quem se podería ter esperado socorro. Jesus foi muito provocativo. Na verdade, Ele denuncia uma religião falsa, formal e destituída de compaixão. Foi o samaritano que se compadeceu e ofereceu todo o socorro que se poderia esperar no local e depois disso. Além de cuidar dos ferimentos com azeite e vinho, ele leva o desconhecido (provavelmente um judeu) para uma estalagem, pagando o equivalente a quase um mês de hospedagem e ainda obrigando-se a indenizar o hospedeiro quando voltasse, caso houvesse alguma despesa extra.

CONCLUSÃO. “Vai e faze o mesmo”. Ao concluir a parábola com a expressão “Vai e procede tu de igual modo”, Jesus mostra aquilo que esperava do doutor da lei, dos ouvintes e de todos nós. O bom samaritano, e não o sacerdote ou o levita, era o exemplo a ser seguido. Ao que parece, tudo o que o doutor da lei desejava era que Jesus lhe desse uma regra ou, quem sabe, uma coletânea delas. Ao contar a parábola e no fim dizer “Vai e faze o mesmo”, Jesus está dizendo que não basta ter a doutrina correta, é necessário amar, pois o amor é a própria vida e dinâmica do reino que Ele veio estabelecer. Interessante que tanto a vida de Jesus como os demais ensinos do Novo Testamento fortalecem e confirmam essa verdade. Se fossemos perguntar, por exemplo, a João, apóstolo, como nós sabemos que temos a vida eterna, uma das suas resposta certamente seria: “Você ama o seu próximo? Deus é amor e aquele que ama é nascido de Deus e conhece a Deus” (1ª Jo 3.16; 4.7,20 e 21).

quarta-feira, 14 de novembro de 2018

PERDOAMOS PORQUE FOMOS PERDOADOS


Mt 18.21-35 “Então Pedro, aproximando-se dele, disse: Senhor, até quantas vezes pecará meu irmão contra mim, e eu lhe perdoarei? Até sete? 22 Jesus lhe disse: Não te digo que até sete; mas, até setenta vezes sete. 23 Por isso o reino dos céus pode comparar-se a um certo rei que quis fazer contas com os seus servos; 24 E, começando a fazer contas, foi-lhe apresentado um que lhe devia dez mil talentos; 25 E, não tendo ele com que pagar, o seu senhor mandou que ele, e sua mulher e seus filhos fossem vendidos, com tudo quanto tinha, para que a dívida se lhe pagasse. 26 Então aquele servo, prostrando-se, o reverenciava, dizendo: Senhor, sê generoso para comigo, e tudo te pagarei. 27 Então o senhor daquele servo, movido de íntima compaixão, soltou-o e perdoou-lhe a dívida. 28 Saindo, porém, aquele servo, encontrou um dos seus conservos, que lhe devia cem dinheiros, e, lançando mão dele, sufocava-o, dizendo: Paga-me o que me deves. 29 Então o seu companheiro, prostrando-se a seus pés, rogava-lhe, dizendo: Sê generoso para comigo, e tudo te pagarei. 30 Ele, porém, não quis, antes foi encerrá-lo na prisão, até que pagasse a dívida. 31 Vendo, pois, os seus conservos o que acontecia, contristaram-se muito, e foram declarar ao seu senhor tudo o que se passara. 32 Então o seu senhor, chamando-o à sua presença, disse-lhe: Servo malvado, perdoei-te toda aquela dívida, porque me suplicaste. 33 Não devias tu, igualmente, ter compaixão do teu companheiro, como eu também tive misericórdia de ti? 34 E, indignado, o seu senhor o entregou aos atormentadores, até que pagasse tudo o que devia. 35 Assim vos fará, também, meu Pai celestial, se do coração não perdoardes, cada um a seu irmão, as suas ofensas.

INTRODUÇÃO. Respondendo um questionamento de um dos discípulos sobre o perdão, Jesus contou a parábola denominada de “credor incompassivo”, cujo ensinamento principal foi de que assim como Deus perdoa as nossas iniquidades, de forma semelhante devemos exercer misericórdia de forma ilimitada para com aqueles que pecam contra nós.

- Esta parábola, que ocorre apenas em Mateus, é uma narrativa muito simples sobre a necessidade de liberarmos perdão para aquele que nos ofendeu ou machucou. A razão é simples: fomos alcançados pelo gracioso perdão de Deus. Perdão, sem sombra de dúvidas, é um dos temas centrais da palavra de Deus.

I. INFORMAÇÕES A RESPEITO DESTA PARÁBOLA
1. Curiosidades. Esta parábola destaca-se entre as demais pelas seguintes características: 1.1.Ela só é encontrada no Evangelho de Mateus (Mt 18.23-35).
1.2. Está entre as classificadas “parábolas do Reino” (Mt 18.23).
1.3.É uma das poucas parábolas que trata acerca do perdão (Mt 18.35), a outra está em Lucas 7.41,42.

2. Pano de fundo. O pano de fundo que levou Jesus a contar esta parábola, foi para responder uma pergunta do apóstolo Pedro. Ele queria saber quantas vezes tinha que perdoar esse irmão: “Senhor, até quantas vezes pecará meu irmão contra mim, e eu lhe perdoarei?” (Mt 18.21-b). O Talmude judaico baseado em Amós caps 1 e 2, ensinava que não se devia perdoar ao ofensor além de três vezes (BEACON, 2008, p. 131 – acréscimo nosso). Talvez querendo mostrar-se generoso, Pedro sugeriu: “Até sete?” (Mt 18.21-c), quem sabe aproveitando uma fala de Jesus em outra ocasião, quando disse que devia se perdoar o irmão até “sete vezes no dia” (Lc 17.3,4). No entanto, a resposta de Jesus foi extremamente confrontadora a perspectiva humana sobre o perdão, mostrando que não deve haver limites para exercê-lo: “Não te digo que até sete; mas, até setenta vezes sete” (Mt 18.22). Se sete é um número que representa completude, setenta vezes sete deve ser plenitude absoluta (BOYER, 2009, p. 383).

II. OS PERSONAGENS DA PARÁBOLA
Embora a narrativa parabólica seja fictícia os personagens são figuras presentes do cotidiano de Israel. Vejamos quais os personagens desta parábola:

1. O rei (v.23). Jesus iniciou esta parábola falando do primeiro personagem: “o reino dos céus pode comparar-se a um certo rei” (Mt 18.23-a). É dito que este rei resolveu ajustar as contas com seus servos, a quem ele havia emprestado um dinheiro (Mt 18.23); que ele era generoso (Mt 18.26,33); mas, também justo (Mt 18.32-34).

2. Um servo (vs. 23-24). Quando o rei iniciou o trabalho de prestação de contas entre os seus servos “foi-lhe apresentado um que lhe devia dez mil talentos” (Mt 18.24-b). Sua dívida era muito grande visto que “um talento era o valor equivalente a seis mil denários, o que equivalia a seis mil dias úteis de trabalho ou trinta anos de trabalho. Um único talento era quase a renda de uma vida inteira” (ROBERTSON, 2011, p. 209). Na parábola é dito que ele não tinha com que pagar (Mt 18.25-a). Diante disso, o rei, valendo-se da Lei de Moisés (Êx 22.3; Lv 25.39,47), ordenou que este servo e toda a sua família fossem seus servos a fim de quitar a dívida (Mt 18.25). Ao saber que ele toda a família serviriam ao rei, este servo prostrou-se diante do rei e apelou para a sua misericórdia, rogando-lhe que lhe desse mais tempo para salvar a dívida completamente (Mt 18.26). Diante do pedido do servo, o rei, movido de íntima compaixão, decidiu perdoá-lo da dívida: “Então o senhor daquele servo, movido de íntima compaixão, soltou-o e perdoou-lhe a dívida” (Mt 18.27). Sobre este servo é dito que era apto a pedir misericórdia, mas não de exercer misericórdia (Mt 18.26,33). Por causa dessa atitude ele é chamado pelo rei de “servo malvado” (Mt 18.32-a).

3. O conservo (v. 28). Ao sair da presença do rei com a sua dívida perdoada, o servo encontrou-se com um dos seus conservos (Mt 18.28); e, ao abordá-lo cobrou lhe os “cem dinheiros” ou “cem denários”, que este lhe devia: “e, lançando mão dele, sufocava-o, dizendo: Paga-me o que me deves” (Mt 18.28-b). O denário equivalia a um dia de trabalho (Mt 20.2) (CHAMPLIN, 2004, p. 474). O conservo diante da cobrança se humilhou e rogou misericórdia para poder saldar o seu débito “... prostrando-se a seus pés, rogava-lhe, dizendo: Sê generoso para comigo, e tudo te pagarei” (Mt 18.29). No entanto, seu pedido por generosidade foi negado, e ele foi sentenciado a prisão, até que quitasse a dívida (Mt 18.30). Embora estivesse em seu poder perdoar o conservo, este homem o negou: “Ele, porém, não quis...” (Mt 18.30).

Vejamos abaixo as diferenças entre o servo e o conservo:

SERVO.
- Foi chamado pelo rei para prestar contas (Mt 18.23,24).
- Devia dez mil talentos (Mt 18.24).
- Prostrou-se para pedir tempo para pagar e foi perdoado (Mt 18.25-27).

CONSERVO.
- Foi abordado com violência pelo seu senhor (Mt 18.28)
- Devia cem dinheiros (Mt 18.28).
- Prostrou-se para pedir tempo para pagar e foi preso (Mt 18.29,30).

III. ENTENDENDO QUEM OS PERSONAGENS REPRESENTAM
Nem sempre os personagens de uma parábola tem significação. No entanto, nesta, percebemos que Cristo lhes dá um sentido. Vejamos:

1. Deus é o rei (v. 35). Embora nem sempre nas parábolas cada personagem tenha um significado, nesta especificamente, fica claro que o “rei” é uma figura de Deus, como o próprio Jesus aplica (Mt 18.35). O rei é o principal chefe ou governante de uma tribo ou nação” (CHAMPLIN, 2004, p. 617). O título de rei, nas Escrituras, tanto é aplicado ao Pai (Sl 10.16; 145.13; Jr 10.10) como ao Filho (Ap 17.14; 19.16). O monarca desta parábola retrata o caráter divino pois é apresentado como um rei que:

1.1. Se compadece: “movido de íntima compaixão” (Ef 2.4,5; Tt 3.5; 1ª Pd 2.10; Sl 103.13; Rm 12.1).

1.2. Liberta: “soltou-o” (Ef 1.7; 1ª Pd 1.18,19; Lv 17.11).

1.3. Perdoa: “e perdoou-lhe a dívida” (Is 55.7; 1ª Jo 1.9). Sua bondade em perdoar o servo de sua dívida e sua justiça e juízo de puni-lo por negar misericórdia ao conservo retratam perfeitamente o caráter divino que está disposto a perdoar o pecador arrependido (Mt 9.13; Lc 5.32; Rm 11.32), mas também de punir ao pecador perdoado que se recusa liberar perdão (Mt 6.15; 18.34,35; Mc 11.26).

2. Nós somos os servos (Mt 18.23,35). Os servos do rei são todos aqueles que se submeteram a Cristo como Senhor e Salvador. Isto fica evidente no início da parábola, quando Jesus está falando do Reino de Deus aos súditos desse Reino, ou seja, seus discípulos (Mt 18.23). Assim como este servo tinha uma dívida da qual não tinha condições de pagar ao rei e clamando por misericórdia foi perdoado, ele retrata a nossa condição de pecadores diante de Deus (Rm 3.23) que somente por Sua imensurável graça poderíamos ser restaurados, pois o pecado é uma dívida que o homem contrai, para a qual o único recurso é o perdão (Cl 2.13; 1ª Jo 1.9; 2.12).

3.O conservo é o nosso irmão (Mt 18.28,35). O conservo da parábola é o nosso irmão, isto fica claro, a luz do contexto, ou seja, do texto que precede a parábola, quando vemos Jesus falar sobre o tratamento que se deve a “um irmão que peca contra o outro” (Mt 18.15). O rei perdoou o servo a sua dívida e esperava que ao menos o servo perdoado pudesse fazer o mesmo com o seu conservo, por isso disse “Não devias tu, igualmente, ter compaixão do teu companheiro, como eu também tive misericórdia de ti?” (Mt 18.33). Não podemos agir com o nosso irmão diferente da forma como Deus age conosco (Lc 10.27). Isto Jesus ensinou quando disse “e, quando estiverdes orando, perdoai, se tendes alguma coisa contra alguém, para que vosso Pai, que está nos céus, vos perdoe as vossas ofensas” (Mc 11.25). O apóstolo Paulo também firmou: “como Cristo vos perdoou, assim fazei vós também” (Cl 3.13; Ef 4.32); os demais apóstolos transmitiram o mesmo ensino (1ª Pd 2.21; 1ª Jo 1.7; 4.7).

IV. O PRINCIPAL ENSINAMENTO DESTA PARÁBOLA: O PERDÃO

Mateus registrou os ensinamentos de Jesus mais diretamente relacionados com a conduta dos seus discípulos como membros do Reino trazido à terra por Ele. O reino dos céus tem valores essencialmente diferentes dos que caracterizam as instituições terrenas e as organizações seculares. A sociedade dos perdoados fica sem sentido, se os que são perdoados não perdoam (TASKER, 2006, p. 138). O verbo “perdoar” significa: “renunciar a punir; desculpar; poupar; ver com bons olhos” (HOUAISS, 2001 p. 2185). Sobre o perdão, Jesus ensinou que:

1. O perdão não deve ser limitado (vs. 21-22). A resposta de Jesus a pergunta de Pedro quantas vezes se devia perdoar o irmão ofensor com a sugestão de “até sete” (Mt 18.21-c), teve como resposta do Mestre “até setenta vezes sete” (Mt 18.22), o que significa dizer: de forma ilimitada. Assim como Deus amou o mundo de maneira ilimitada (Jo 3.16), devemos reproduzir este amor nos nossos relacionamentos (1ª Jo 3.16).

2. O perdão não deve ser negado (Mt 18.35-a). Jesus ensinou que não podemos negar o perdão aquele que arrependido nos rogar, tendo como base o caráter generoso do próprio Deus, que sempre nos perdoa quando sinceramente lhe pedimos. A Bíblia diz que Ele “está pronto a perdoar” (Sl 86.5); e, que é “grandioso em perdoar” (Is 55.7). Veja ainda: (2º Cr 7.14; Pv 28.13; 55.7; 1ª Jo 2.1). Portanto, quando perdoamos nos assemelhamos a Deus (Lc 6.36; Ef 4.32 Cl 2.13; 1ª Jo 1.9; 2.12).

3. O perdão não deve ser superficial (Mt 18.35-b). Perdoar é mais que palavras (1ª Jo 3.18). Jesus ensinou que é preciso que o perdão brote do coração, ou seja, do íntimo do nosso ser (Mt 18.35-b). A Bíblia diz que não podemos guardar ira no coração (Ef 4.26; Tg 3.14), nem permitir que nele brote raiz de amargura (Ef 4.31; Hb 12.15). Como é nele que pode se formar o ódio, é nele que o perdão deve nascer a fim de curar o mal em sua nascente. Ainda sobre o perdão é preciso destacar que:

3.1. É uma condição para permanecermos em comunhão Deus (Mt 6.12,14-15; 18.35; Mc 11.25,26).

3.2. Ele revela se somos autênticos cristãos (Mt 3.8; 7.20; 12.33; Lc 6.44; Gl 5.22).

3.3. Ele é condição para Deus receber a nossa oferta (Mt 5.23,24).

CONCLUSÃO. Jesus ensinou que as ofensas que os homens cometem uns contra os outros são mínimas em comparação às ofensas que todos cometem contra Deus. Se Ele nos perdoa por Sua graça, devemos tratar o nosso próximo com a mesma graça.

FONTE DE PESQUISA.
1. SITE ASSEMBLÉIA DE DEUS. file:///C:/Users/Elias/Downloads/1f32aca61b.pdf - ACESSO DIA 14/11/2018.
2. BOYER, Orlando. Espada Cortante. CPAD.
3. CHAMPLIN, R. N. Dicionário de Bíblia, Teologia e Filosofia. HAGNOS.
4. HOUAISS, Antônio. Dicionário da Língua Portuguesa. OBJETIVA.
5. HOWARD, R.E, et al. Comentário Bíblico Beacon. CPAD.
6 ROBERTSON, A.T. Comentário de Mateus e Marcos. CPAD.
7. STAMPS, Donald C. Bíblia de Estudo Pentecostal. CPAD.

quarta-feira, 7 de novembro de 2018

SINCERIDADE E ARREPENDIMENTO DIANTE DE DEUS



Lucas 18.9-14 “E disse também esta parábola a uns que confiavam em si mesmos, crendo que eram justos, e desprezavam os outros: 10 Dois homens subiram ao templo, a orar; um, fariseu, e o outro, publica no. 11 O fariseu, estando em pé, orava consigo desta maneira: Ó Deus, graças te dou, porque não sou como os demais homens, roubadores, injustos e adúlteros; nem ainda como este publicano. 12 Jejuo duas vezes na semana e dou os dízimos de tudo quanto possuo. 13 O publicano, porém, estando em pé, de longe, nem ainda queria levantar os olhos ao céu, mas batia no peito, dizendo: Ó Deus, tem misericórdia de mim, pecador! 14 Digo-vos que este desceu justificado para sua casa, e não aquele; porque qualquer que a si mesmo se exalta será humilhado, e qualquer que a si mesmo se humilha será exaltado.”

INTRODUÇÃO. Talvez a parábola do fariseu e do publicano seja uma das mais conhecidas. Ela mostra que a dependência humilde diante de Deus, em vez de justiça própria, é a base para a resposta de oração. Muitas pessoas acreditam que Deus deve responder suas orações com base naquilo que elas fazem para Ele. Contudo, na contramão da meritocracia religiosa, e dentro da gloriosa graça de Deus, que faz cair chuva sobre justos e injustos (Mt 5.45), a lição de hoje nos ensina que o que Deus quer é que nossas orações sejam permeadas de sinceridade e arrependimento. Quando oramos a Deus, devemos confiar em quem Ele é, e não em quem nós somos. Jesus ensina que são felizes os humildes de espírito (Mt 5.3), aqueles que reconhecem a sua real condição diante de Deus. Por isso, hoje vamos falar sobre a sinceridade e o arrependimento para com o Senhor.

Se a primeira parábola tratava da perseverança na fé (vv. 1, 8), esta parábola agora fala da verdadeira postura que se espera de um homem de fé: reconhecimento de que tudo o que temos ou somos é por misericórdia divina, não por nossos próprios méritos! Assim, embora utilize-se de uma parábola que fala de oração, Jesus pretende fazer-nos refletir sobre nossa postura diante dos homens e para com Deus em todos os aspectos de nossa vida!

I. INTERPRETAÇÃO DA PARÁBOLA DO FARISEU E DO PUBLICANO
1. O propósito da parábola.
O evangelista Lucas nos diz o motivo de Jesus ter contado esta parábola:

“A alguns que confiavam em sua própria justiça e desprezavam os outros, Jesus contou esta parábola” (v. 9, NVI)

Lembremo-nos que Jesus costumava andar cercado de multidões, e nem todos ali eram verdadeiramente convertidos. Além disso, era comum que perto de Jesus estivessem sempre falsos religiosos, como alguns fariseus, escribas e intérpretes da lei (embora entre eles também existissem crentes verdadeiros). Ao público específico de religiosos arrogantes é que Jesus dirige esta parábola, com a clara intenção de confrontá-los e, ao mesmo tempo, ensinar-lhes sobre a verdadeira postura religiosa que agrada a Deus.

2. O contraste entre “o melhor” e “o pior”.
O contraste estabelecido por Jesus entre os dois personagens é bem proposital. A intenção é contrastar o pior com o melhor dos homens, a fim de revelar que aos olhos de Deus o pior pode ser o melhor, enquanto que o melhor pode ser o pior! “O Senhor não vê como vê o homem, pois o homem vê o que está diante dos olhos, porém o Senhor olha para o coração” (1Sm 16.7).

Jesus pega a figura do fariseu, estimado pelos judeus como um exemplo de pureza, obediência à lei, fidelidade à nação e moralidade, e a figura do publicano, odiado pelos judeus e visto como um mau exemplo, um impuro, um traidor e um ladrão (publicanos eram judeus que trabalhavam para os dominadores estrangeiros, os romanos, cobrando impostos de seus conterrâneos sobre propriedades em território judeu).

Enquanto que ser fariseu representava ter prestígio religioso e social (Fp 3.5), ser publicano representava péssima reputação (o próprio Jesus sugere isso quando diz que se deve considerar como “publicano” o irmão que não aceitar a repreensão da igreja. Conf. Mt 18.15-17). Publicanos foram citados ao lado das prostitutas, como estando no mesmo nível moral (Mt 21.31,32), e a palavra “publicano” virou sinônima de “pecador” (Conf. Lc 19.2.7).

Assim sendo, o especialista em Novo Testamento, Dr. Craig Keener, ressalta que para entender esta parábola de Jesus, “um cristão tradicional precisaria imaginar, no lugar dos personagens da história, o diácono ou professor da escola dominical mais ativo da igreja de um lado e, do outro, um traficante de drogas, ativista gay ou político corrupto” [1]. Se esta comparação nos parece ofensiva, especialmente nós que de fato somos professores da escola dominical, então começamos a sentir um pouco do impacto que esta parábola deve ter causado nos ouvidos daqueles que se julgavam melhores que “os demais homens” (v. 11).

Aos olhos de Deus, agrada mais um desprezível pecador que reconhece sua culpa e suplica por perdão do que um respeitado religioso que julga-se melhor que os demais homens e mui digno de louvores!

II. A HIPOCRISIA DO FARISEU
Marshall nos diz que “o fariseu era um homem piedoso, que vivia uma vida honesta e justa [moralmente falando]. Ele fazia até mais do que a lei [de Moisés] exigia. Jejuava duas vezes por semana (…), embora a lei exigisse ao povo jejuar apenas uma vez por ano. Ele dizimava sobre todos os seus rendimentos, e não apenas sobre as porções exigidas” [2]. Ao mero julgamento humano, era um perfeito religioso, um exemplo, um padrão de excelência! Todavia, Deus que “sonda os rins e o coração” (Ap 2.23) sabia o quanto o coração daquele fariseu estava cheio de rapina! (Lc 11.39)

1. O grupo dos fariseus.
Os fariseus eram o mais destacado grupo religioso nos tempos de Jesus. Superavam em número e em influência política e religiosa aos saduceus (classe geralmente composta de aristocratas, membros de famílias ricas de Israel) e aos essênios (grupo religioso que vivia nos desertos para evitar as “contaminações” dos grandes centros urbanos, e, portanto, menos envolvidos com a sociedade). Foram o grupo mais constante nas oposições a Cristo e aos seus apóstolos, sendo não raro confrontados duramente pelo Senhor, como nas muitas repreensões em Mateus 23.

Embora tenha surgido com a pretensão de serem um grupo separado das corrupções morais da sociedade (esse, aliás, é o significado da palavra fariseu – em hebraico, parash, isto é, separado), e também tivessem muitos ensinos que de fato refletiam a ortodoxia da lei e dos profetas (algo que Jesus mesmo reconheceu Mt 23.3), os fariseus acabaram na prática se desviando da direção correta quando passaram a valorizar mais preceitos e tradições humanas do que a própria Palavra de Deus, e reivindicando para si maior pureza que os demais homens.

O Novo Testamento apresenta os fariseus como tradicionalistas, moralistas, legalistas, cerimonialistas, avarentos (Lc 16.14) e, mais especialmente, hipócritas (confira na íntegra capítulo 23 de Mateus).

2. Tão hipócritas quanto arrogantes.
Entretanto, esta parábola de Lucas 18 não tenciona apontar a hipocrisia propriamente dos fariseus ou das pessoas que com aquele fariseu da parábola se identificam; antes, aqui destaca-se outra característica negativa do falso religioso: a arrogância. Isso porque a parábola não pretende negar que o fariseu fazia de fato o que ele diz que fazia, mas sim demonstrar que tal postura de autoadmiração na oração constituía uma arrogante confiança na própria justiça; e que o menosprezo aos outros pecadores na oração configurava um grande erro, já que o prazer de Deus está naquele “que se humilha” (v. 14) e não naquele que humilha o outro!

Se a parábola da viúva persistente no início do capítulo falava de um juiz que “não temia a Deus nem respeitava aos homens” (v. 2), esta parábola do fariseu e do publicano não está muito distante daquela, já que o fariseu é também um homem que não demonstra genuíno temor a Deus nem respeito ou sentimento de condescendência pelos outros.

3. Atitudes erradas na oração do fariseu.
Conforme o texto bíblico, dois erros estavam sendo cometidos pelo público a que esta parábola se destina:

3.1. Confiança na própria justiça. Esse foi o erro dos judeus que rejeitaram a Cristo, visto que confiavam em suas boas obras para serem justificados diante de Deus. Como disse o apóstolo Paulo, “Israel, que buscava a lei da justiça, não chegou à lei da justiça. Por quê? Porque não foi pela fé, mas como que pelas obras da lei; pois tropeçaram na pedra de tropeço” (Rm 9.31,32).

Os religiosos que rejeitaram a Cristo e a mensagem do Evangelho pensavam que a justificação diante de Deus se dava na base da “meritocracia moral e religiosa”, isto é, mediante o mérito que cada um poderia apresentar diante de Deus em razão da boa conduta e do volume de suas boas obras. Ledo engano! “Quem lhe deu primeiro a ele, para que lhe seja recompensado? Porque dele e por ele, e para ele, são todas as coisas; glória, pois, a ele eternamente” (Rm 11.35,36). Paulo, um fariseu convertido a Jesus Cristo, sabia que “pela graça de Deus sou o que sou” (1Co 15.10). E “se é por graça, já não é pelas obras” (Rm 11.6), “para que nenhuma carne se glorie diante dele” (1Co 1.29). Aos que confiam em si mesmos e se vangloriam de suas boas obras, que pese a palavra do Senhor através do profeta Jeremias: “Maldito o homem que confia no homem” (Jr 17.5).

3.2. Desprezo pelos outros. Essa é uma consequência óbvia da autoconfiança e da falsa concepção de justiça própria: o homem que a si mesmo se exalta tende a humilhar e desprezar os outros. Está sempre se comparando com os demais, “tendo de si mesmo um conceito mais elevado do que deve ter” (Rm 12.3). Ele nunca se compara com Deus para perceber o quanto está aquém d’Ele, antes vive se comparando com outros homens falhos para autogratificar-se quando se vê o quanto está além deles.

O arrogante é geralmente preconceituoso. Como o fariseu da parábola que olhava para o publicano como uma gentalha, o religioso arrogante costuma sempre ver sua santidade como superior a dos demais crentes, sua igreja como melhor que a dos demais irmãos, sua doutrina mais ortodoxa, seu conhecimento mais robusto e sua fé mais genuína. A Bíblia orienta “Louvem-te os lábios estranhos e não a tua própria boca” (Pv 27.2), mas o religioso arrogante não cessa de se bajular; a Bíblia exorta “Não sejam sábios aos seus próprios olhos” (Rm 12.16b), mas o religioso arrogante julga-se sempre acima da média e o mais qualificado para estar na dianteira.

Ora, se Deus que é mui grande a ninguém despreza (Jó 36.5), por que nós deveríamos desprezar o nosso semelhante, especialmente quando é um pecador buscando a Deus como nós?

3. Tornando Deus cúmplice no pecado.
Não deve surpreender-nos que no início da oração o fariseu tenha dito “Graças te dou, ó Deus…”, pois ao dar graças a Deus pela sua postura arrogante, o fariseu está inconscientemente cometendo mais um pecado: tornando Deus cúmplice de sua vida soberba, como se o sobejar de suas boas obras, que superavam as ordenanças da lei mosaica, e o sentimento de autossatisfação em seu coração fossem procedentes de Deus!

Entretanto, visto que Deus não pode ser responsabilizado jamais pela vaidade daquele moralista, Jesus nos diz que o fariseu “orava de si para si mesmo” (v. 11, ARA). Noutras palavras, sua oração era tão ególatra que, embora invocando a Deus, era dirigida a si mesmo, não a Deus o Pai. Sabe quando dizemos que uma oração não passou do teto? Pois bem, foi aquela oração do fariseu! Deus dá graça ao humilde, mas resiste ao soberbo (Tg 4.6).

4. Cuidado com a propaganda na oração!
O exegeta A.T. Robertson diz que a oração do fariseu foi, na verdade, “um recital complacente das suas próprias virtudes para sua própria satisfação, e não comunhão com Deus, embora ele se dirija a Deus” [3]. A oração é um meio pelo qual reverenciamos ao Senhor, o adoramos na beleza de sua santidade e o exaltamos com sinceridade de coração. Usar a oração para propagandear orgulhosamente a própria justiça diante de Deus é perverter os propósitos de tão sublime instrumento de comunicação com Deus e adoração!

O pregador batista Charles Spurgeon dizia que até em nossa santidade há pecado; eu direi que até mesmo em nossa oração há transgressão! Na verdade, mesmo genuínos homens ou mulheres de Deus podem cair no erro daquele fariseu, o erro de fazer da oração instrumento de propaganda diante de Deus. O Senhor conhece nossas obras, e sabe julgar entre boas ações feitas com boas intenções e boas ações feitas com más intenções!

Agora, não vamos confundir uma oração soberba, como a do fariseu desta parábola, com a petição humilde, sincera e quebrantada, como aquela feita no Antigo Testamento pelo rei Ezequias, que, quando avisado de morte, voltou-se para a parede e suplicou com lágrimas a Deus que lhe permitisse viver um pouco mais. Ezequias argumentou em poucas palavras: “Ah! Senhor, peço-te, lembra-te agora, de que andei diante de ti em verdade, e com coração perfeito, e fiz o que era reto aos teus olhos” (Is 38.3). Note que Ezequias também fala a Deus sobre suas boas obras e a retidão de sua conduta.

Mas, embora tenha falado a Deus em oração sobre seu procedimento, a atitude do piedoso rei de Judá distingue-se da postura altiva do fariseu sob os seguintes aspectos:

Oração de Ezequias - Oração do fariseu

O rei não se compara com ninguém. O fariseu se compara com os “demais homens”.
É uma oração de petição, reconhecendo que depende do favor do Senhor. É uma oração de autoadmiração, julgando-se merecedor da atenção divina.
É uma oração regada a lágrimas (Is 38.3b). É uma oração enfeitada com exaltação pessoal
O rei “orou ao Senhor” (Is 38.2). O fariseu “orava de si para si mesmo” (Lc 18.11)
A oração de Ezequias foi atendida. A oração do fariseu foi rejeitada.

Faço esta ponderação para dizer que não é de todo errado dirigir-se a Deus dizendo o que fez para o Senhor. Na verdade, se entendemos que Deus é nosso Pai e nosso Amigo, então não deveríamos ficar receosos de dizer-lhe o que temos feito para Ele. Todavia, que nossa atitude jamais seja de arrogância, que jamais usemos a oração para fazer comparações depreciativas ou nos gabar diante de Deus; antes, reconheçamos que tudo o que temos ou somos é pela graça de Deus, não porque sejamos melhores que outras pessoas ou merecedores das benesses divinas. Pois de fato não somos!

Que haja sempre em nós a contrição de Ezequias e nunca a soberba do fariseu.

III. A SINCERIDADE DO PUBLICANO
1. A distância entre o publicano e o fariseu.
O publicano orava no templo, a certa distância do fariseu (v. 13) [4]. De fato, a distância não é só espacial, mas também é uma distância nos propósitos e na postura espiritual: enquanto o fariseu orava ostentando seu currículo diante de Deus, o publicano orava suplicando por misericórdia; enquanto o fariseu julgava-se bom demais, o publicano reconhecia-se um indigno pecador.

Não seria uma interpretação forçada dizer que talvez o publicano propositalmente tenha se colocado distante do fariseu, reconhecendo sua indignidade de estar perto daquele religioso que era tido como um homem “separado”, “justo” e “bom” pelo público em volta, ainda que sob julgamento divino as coisas não fossem bem assim.

2. Uma oração dramática.
O publicano julgava-se tão miserável que se recusava erguer os olhos ao céu. Se o salmista lhe dissesse “eleve os olhos aos montes” (Sl 121.1), o publicano pediria licença para continuar com os olhos voltados para o chão, julgando-se não merecedor de erguer a cabeça ao Deus santíssimo.

A expressão “batendo no peito” fala-nos de um profundo pesar, típica reação do judeu que orava a Deus em momento de crise ou luto. Mas a atitude aqui reveste-se de um profundo significado: o publicano sentia a dor pelo pecado. Não é um autoflagelo, mas uma expressão dramática de alguém que está em agonia por não conseguir cumprir a vontade de Deus. Ele não está se ferindo, mas com toda franqueza confessando seu fracasso pessoal diante do Senhor. Somente alguém com profunda convicção de pecado e somente alguém que possui uma adequada percepção da santidade divina pode bater no peito enquanto ora a Deus.

Há os que batem no peito orgulhosamente, mas não é este o caso. O bater no peito aqui é de alguém que está insatisfeito consigo mesmo e busca ansiosamente mudar, melhorar, superar seus próprios fracassos para agradar a Deus. Na verdade, pode-se dizer que esta é a agonia de quem está dando à luz o arrependimento verdadeiro! Quando foi a última vez que batemos no peito com este mesmo sentimento? Quando foi a última vez que confessamos a Deus nossos pecados com tamanha franqueza como a deste publicano? Certamente hoje aquele publicano teria cantado estes versos:

“Mas um dia senti meu pecado, e vi
Sobre mim a espada da lei” [5]

A oração do publicano muito lembra-me a petição de Daniel em Babilônia: “Inclina os teus ouvidos, ó Deus (…) Não te fazemos pedidos por sermos justos, mas por causa da tua grande misericórdia” (Dn 9.18, NVI). Daniel, embora homem justo, via-se na mesma altura dos seus irmãos judeus que haviam pecado contra Deus e motivado a desolação que abateu o reino de Judá. Ele mesmo confessa: “O Senhor nosso Deus é misericordioso e perdoador, apesar de termos sido rebeldes” (Dn 9.9, NVI). Não é a oração demagógica de quem sabe ser bom demais, mas ora dissimulando humildade; antes, é a oração sincera de quem sabe que apesar do louvor dos homens, não passa de pó, de barro e que necessita da misericórdia de Deus a cada dia para triunfar sobre suas próprias fraquezas.

3. Uma oração breve, mas com muito conteúdo.
Percebe-se que o fariseu demorou-se mais em sua oração, enquanto apresentava a Deus seu currículo de boas obras; já o publicano foi mais objetivo, visto que nada tinha a apresentar a Deus a não ser seus pecados. Entretanto, há mais o que aprender com a breve oração do publicano! “Tem misericórdia de mim, que sou pecador” foi a petição daquele detestável judeu, onde vemos duas declarações importantes:

4. Preciso de misericórdia.
Essa misericórdia pela qual o publicano clamava não era no mesmo sentido em que Bartimeu, o cego, clamava. No caso de Bartimeu (Mc 10.47,48), a misericórdia era socorro, ajuda, compaixão (gr. eleeo) para reparação de um dano físico, enquanto que no caso do publicano, a misericórdia era propiciação, reconciliação, fazer as pazes (gr. hilaskomai) para reparação de um dano espiritual. Neste sentido, a tradução Almeida Revista e Atualizada é mais adequada: “…dizendo: Ó Deus, sê propício a mim, pecador!”.

Não tinha nenhum problema com a oração do cego Bartimeu, ele realmente precisava e suplicava por compaixão para que Jesus lhe abrisse os olhos. Entretanto, o que o publicano desta parábola estava pedindo era mais que socorro ou ajuda; era mais, muito mais que um bem material ou físico. Ele estava suplicando com angústia no peito por perdão e reconciliação divina! O problema dele não era no corpo, mas na alma! A sua deficiência não era física, mas moral e espiritual! É a angústia de alguém que sabe estar em inimizade com Deus, entende todos os perigos desta posição adversa, e não quer sofrer o dano de tal posição, antes busca reconciliar-se, fazer as pazes e tranquilizar a sua alma no perdão do Senhor (Sl 2.12; Pv 28.13).
Receio que temos orado muito a Deus por misericórdia no sentido de Bartimeu, mas estamos orando pouco demais por misericórdia no sentido do publicano. Gememos diante de Deus quando nos vemos necessitados de uma vitória física ou financeira, mas não nos angustiamos diante dos nossos fracassos espirituais quando somos diariamente surpreendidos pelas tentações! “Senti as vossas misérias, e lamentai e chorai”, diria Tiago para cada um de nós hoje, “converta-se o vosso riso em pranto, e o vosso gozo em tristeza. Humilhai-vos perante o Senhor, e ele vos exaltará” (Tg 4.9,10). Confrontados por esta palavra, supliquemos em agonia: Ó Deus, tem misericórdia de nós! Sê-nos propício!

5. Sou pecador.
Enquanto o fariseu via-se o melhor dentre os homens, o publicano percebia-se o pior. No texto grego está a palavra hamartolõ, de hamartolos, que significa “dedicado ao pecado”. É assim que Deus espera que todo homem se perceba diante dele, já que “todos pecaram” (Rm 3.23), e Jesus veio “buscar e salvar todo o que se havia perdido” (Lc 19.10).

Se o fariseu achava que tinha crédito no céu, o publicano sabia que estava em débito com Deus! Se o fariseu comparava-se com os outros homens da comunidade e assim julgava-se melhor, o publicano acertadamente estava a se “comparar com o padrão perfeito de Deus e perceber quão pecaminoso era”. [6]

De fato, o título de nossa Lição de hoje está bem apropriado: sinceridade e arrependimento diante de Deus. O indigno publicano estava arrependido e queria gozar de paz com Deus, ao passo em que muitos respeitados fariseus estavam com seus corações endurecidos para o arrependimento (Lc 7.30). Jesus os advertiu severamente noutro momento:

“Os publicanos e as prostitutas estão entrando antes de vocês no Reino de Deus. Porque João veio para lhes mostrar o caminho da justiça, e vocês não creram nele, mas os publicanos e as prostitutas creram. E, mesmo depois de verem isso, vocês não se arrependeram nem creram nele” (Mt 21.31,32).

Visto que as parábolas de Jesus tencionam falar do reino de Deus, vê-se que esta parábola aponta para a admissão de súditos neste reino: admissão que se dá por meio da fé genuína e do arrependimento sincero. Quem se arrepende, entra; quem se justifica a si mesmo, fica de fora!

6. A oração que foi atendida.
Jesus afirma que o publicano, e não o fariseu, “desceu justificado para a sua casa” (v. 14). Dois homens no templo, dois homens orando, dois homens judeus; mas só um, apenas um voltou para casa com a aprovação divina, e foi aquele que nada apresentou a Deus senão sua culpa e seu anseio pela reconciliação divina. O que se exaltou no templo, foi humilhado diante dos anjos de Deus; o que se humilhou no templo, foi declarado justo diante dos anjos de Deus! Não importa tanto nossa reputação aos olhos dos homens, mas aos olhos de Deus!

Já foi dito por alguém que “Deus não presta atenção à pompa das palavras ou à variedade de expressões, mas à sinceridade e à devoção do coração. A chave abre a porta não porque é dourada, mas porque se encaixa na fechadura”. Eis aí o segredo da vitória na oração! Que nossas petições sejam do mesmo tamanho da vontade de Deus, e então dará tudo certo.

CONCLUSÃO. Sabe o que é interessante? Jesus chamou tanto um publicano quanto um fariseu para serem apóstolos e importantes lideranças da Igreja, bem como autores de livros sagrados. De quem estamos falando? Do publicano Mateus (ou Levi, conf. Mt 9.9; Lc 5.27) e do fariseu Saulo de Tarso! (At 23.6; 26.5; Fp 3.5). Mateus é o autor do evangelho que leva o seu nome, e que foi inicialmente direcionado aos crentes judeus; Saulo, também chamado Paulo, foi o apóstolo dos gentios e autor de 13 livros do Novo Testamento.

Como bem pondera I. Howard Marshall, “sem dúvidas houve muitos fariseus bons e bem-intencionados, e por isso não seria correto condenar a todos por igual” [7]. O problema de Jesus não era com o fato dos homens serem religiosamente fariseus ou profissionalmente publicanos, mas com os religiosos arrogantes que fechavam seus corações para a verdadeira fé ao momento em que julgavam-se melhores que os demais homens e dignos de louvores. Deus não se importa com rótulos, nem com aparência; o que Ele não tolera é a nossa altivez de espírito, visto que se agrada da contrição e do quebrantamento. Diante de Deus somos todos publicanos, necessitados de Sua compaixão, de Sua misericórdia! Se alguém julga-se muito importante acima de seus semelhantes, lembre-se que em apenas duas letras o homem pode ser definido: pó! (Sl 103.14).

REFERÊNCIAS

[1] Craig Keener. Comentário histórico-cultural da Bíblia – Novo Testamento, Vida Nova, p. 267
[2] I. Howard Marshall. in Comentário Bíblico Vida Nova, Vida Nova, p. 1518
[3] A.T. Robertson. Comentário Lucas à luz do Novo Testamento Grego, CPAD, p. 311
[4] alguns expoentes interpretam que o publicano orava distante do templo, do lado de fora, longe da vista do fariseu. Entretanto, discordo desta interpretação pelas razões que se encontram no próprio texto: ambos subiram “ao templo” (v. 10), e certamente o publicano, embora afastado do fariseu, mantinha-se sob a vista deste a tal ponto que o fariseu podia dizer “este publicano” (v. 11). Se o publicano estivesse do lado de fora do templo, noutro pátio ou longe da visão do fariseu, não faria sentido o uso do pronome demonstrativo “este publicano”.
[5] hino Conversão, n° 15 na Harpa Cristã, CPAD. Certamente um grande clássico e um dos hinos evangélicos mais populares.
[6] William MacDonald. Comentário Bíblico Popular – Novo Testamento, Mundo Cristão, pp. 212,3
[7] I. Howard Marshall. Op. cit.
Seite da Assembleia de Deus de Campinas SP. https://artigos.gospelprime.com.br/sinceridade-e-arrependimento-diante-de-deus/ Acesso dia 07/11/2018.